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O Quinze- Rachel de Queiroz


Este é um livro publicado em 1930 que tem como temática a pior seca que o Ceará enfrentou em 1915. Pode-se dizer que o livro se baseia em três personagens principais para expor os sentimentos comuns a todos que viveram aquela realidade, mesmo que fossem diferentes, tinham em comum a seca e seus danos.

Conceição é uma mulher que não segue o mesmo padrão das demais mulheres da época porque é uma professora independente e solteira, que dá valor ao exercício intelectual e gosta de ler. Nas férias, Conceição vai para Quixadá para tentar convencer sua avó, Mãe Nácia, a ir com ela para a capital porque lá a vó terá melhores condições de vida. A vó, depois de muita resistência decide ir com a neta.
Vicente é primo de Conceição, filho de pais com condição financeira que lhes permite mudar para um lugar que não é tão atingido pela seca, mas apesar disso e de outros fazendeiros estarem soltando seus gados por não ter mais como mantê-los, Vicente resolve ficar na fazenda dele para cuidar dos gados.
Chico Bento, tinha um emprego como cuidador de uma fazenda, mas com o agravamento da seca, a dona manda soltar o gado e Chico Bento fica sem emprego. Diante dessa realidade, se vê obrigado a emigrar com sua esposa Cordulina e seus filhos.

“E Chico Bento pensava: — Por que, em menino, a inquietação, o calor, o cansaço, sempre aparecem com o nome de fome?” (p.43)

O governo dava passagem para que as pessoas pudessem ir para outros lugares, mas havia pessoas que  só pegavam para revender e assim acabava prejudicando outras pessoas que realmente precisavam delas, como foi o caso da família de Chico Bento. Na falta de passagens, a família teve que ir a pé. Durante a viagem, um dos filhos, o mais novo, sem ter o que comer, escondido da mãe, comeu  mandioca crua e morreu envenenado. Essa foi uma das cenas mais dolorosas. Em outra cena, em que Cordulina está delirando de tanta fome e o marido sai para procurar alguma coisa para comer, ao encontrar uma cabra a mata e quando termina, o dono aparece e reclama seu animal tomando dos braços de Chico, depois que este explicou que sua mulher estava quase morrendo de tanta fome, o homem deu as tripas do animal e eles foram obrigados a comer as tripas sujas, sem água para lavar. Esse é só uma das situações em que o leitor percebe o quanto a fome é capaz de desumanizar o ser humano, que se submete às mais diversas situações para manter sua sobrevivência.

“Recordando a labuta do dia, o que o dominava agora era uma infinita preguiça da vida, da eterna luta com o sol, com a fome, com a natureza”. (p.46)

Conceição e Vicente são primos mas sentem atração um pelo outro, o problema é que nenhum dos dois toma a iniciativa e acabam pensando que o outro não gosta. Essa questão leva a duas outras que são postas no livro: o papel da mulher na sociedade daquela época e os resquícios do tempo da escravidão, que só foi abolida em 1888. Quanto à primeira questão, o natural era que as mulheres casassem e enquanto os maridos trabalhavam, elas ficassem cuidando da casa e dos filhos. Conceição, como já dito, vai na contramão de tudo isso por ainda ser solteira e por não desejar ter filhos, além de passar suas horas livres lendo, coisa que as mulheres daquela época não faziam. Quanto à segunda questão, tem uma cena em que Conceição está conversando com sua avó e esta lhe conta de uma história que ouviu sobre Vicente estar sendo falando com outra mulher, que é negra, ao que Conceição responde: “–Então  Mãe Nácia acha uma  tolice um moço branco andar se sujando com negras?”, ao que a senhora responde: “–Mas, minha filha, isso acontece com todos… Homem branco, no sertão- sempre saem essas histórias… Além disso não é uma negra; é uma caboclinha clara…”. (grifos meus). Aqui fica evidente o racismo. Primeiro, homens brancos não podem relacionar-se com mulheres negras e depois a negação da cor para amenizar, como se dizer que uma pessoa é negra fosse um xingamento.

A narrativa é feita de forma direta e objetiva, o que intensifica a dor e sofrimento pelos quais os personagens passam. Não tem como não se comover.
Para complementar a leitura e ter uma visão mais ampla da história, indico a leitura da HQ baseada no livro, que tem roteiro e arte de Shiko.



12 Comentários

  • Responder
    Unknown
    23 outubro, 2016 em 16:27

    Esse é um livro que preciso ler. Me envergonho de não ter feito ainda, a Rachel todos sabemos que tem uma escrita maravilhosa e a obra em si é muito importante para a nossa Literatura, principalmente para nós do nordeste, que sabemos o quanto a seca do 15 transformou a história da nossa população.
    Ótima resenha;

    Abraço;

    http://estantelivrainos.blogspot.com.br

  • Responder
    Poesia na alma
    23 outubro, 2016 em 16:27

    Oi. Que resenha maravilhosa, reli O Quinze ano passado e é sempre um livro que me causa conflitos, pensa em toda a história. Gostei de você ter evidenciado o racismo, aliás, gostei de seu blog.

  • Responder
    Sil
    23 outubro, 2016 em 16:27

    Olá, Maria.
    Não conhecia esse livor ainda, mas me interessei em ler ele. Gosto de livros que contam histórias e tem como pano de fundo acontecimentos reais. Vou anotar a dica para ler futuramente.

    Blog Prefácio

  • Responder
    Licavargas
    24 outubro, 2016 em 13:21

    Embora conheça a autora, não conhecia esse livro. Pelo menos não consegui me lembrar de ter lido pela sua resenha.
    É tão incrível quando a gente vê um livro escrito a tanto tempo que ainda consegue tocar e emocionar nos dias de hoje. Ainda mais se a gente pensar que a situação no nordeste pode até ter melhorado um pouco do que o retratado na obra, mas ainda tem muito o que melhorar já que muitos ainda passam por situações ruins, ainda mais quando pensamos que muita coisa poderia ser feita se não fossem os corruptos (sejam os politicos ou as pessoas que pegam o que não precisam como os citados na história).
    Beijinhos,
    Lica
    Amores e Livros

  • Responder
    Unknown
    24 outubro, 2016 em 14:18

    Olá, Maria.
    Já tinha ouvido falar sobre a obra, mas não sabia do que se tratava.
    Adoro histórias que tenham acontecimentos reais na história, e as questões abordadas também me deixaram bastante curiosa.
    Com certeza pretendo conferir a obras.
    Adorei a resenha e os pontos que você ressaltou.
    Beijos.

    Li
    Literalizando Sonhos

  • Responder
    Amanda França
    24 outubro, 2016 em 22:52

    Oi, tudo bem? A Rachel é uma escritora bem famosa, mas não conhecia esse livro. Não gosto muito de histórias assim, por que contam a realidade, e muitas vezes, a realidade é dolorosa. Provavelmente choraria na parte em que o garoto morre envenenado.

  • Responder
    Ju
    25 outubro, 2016 em 23:40

    Não curto livros desse tipo, tão próximos da realidade, e fiquei ainda com menos vontade de ler depois que você falou das tripas, meu estômago embrulhou completamente, tive que parar de ler e respirar fundo para não vomitar. Não é mesmo pra mim.

  • Responder
    Diovana
    26 outubro, 2016 em 01:30

    Oii..
    Li esse livro há muito tempo e nem lembrava mais da história direito. Adorei poder relembrar algumas coisas, e até mesmo perceber certas coisas que na época da leitura passaram despercebidas.

  • Responder
    Driely Meira
    26 outubro, 2016 em 23:09

    Oiee ^^
    Eu conheci a Rachel há pouco tempo, quando estudei um pouco suas obras na escola. Ganhei um exemplar de "O quinze" de um amigo, mas ainda não consegui ler, tem muito livro na frente…hehe' mas estou bastante animada, mesmo sabendo que é uma leitura bem forte.
    MilkMilks ♥

  • Responder
    D e s s a
    27 outubro, 2016 em 02:18

    Eu nunca li a obra, na realidade confesso que desconhecia dela, mas achei a premissa interessante. Eu gosto de leituras mais intensas, e um livro escrito na década de 30 falar sobre racismo me deixa bem curiosa para conferir.
    beijos
    http://www.apenasumvicio.com

  • Responder
    Cia do Leitor
    30 outubro, 2016 em 22:23

    Olá!
    Não conhecia a obra, mas parece muito interessante. Como se trata de um livro antigo, era pra estar ciente da existência dele. A temática é muito boa, já que aborda o racismo, coisa comum naquela época, não que tenha mudado muita coisa. Só que agora corremos atrás de nossos direitos e antes, era normal. Gostei!
    Ni
    Cia do Leitor

  • Responder
    Unknown
    31 outubro, 2016 em 22:51

    Esse livro é um clássico né Maria… Provavelmente farei a leitura dele ano que vem. Sua resenha me deixou bastante animada.
    Beijos

    http://blog-myselfhere.blogspot.com.br/

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